Diário de um Louco
- Frank Abreu
- 30 de mai. de 2024
- 2 min de leitura
Atualizado: 30 de mai. de 2024
Diário de um Louco narra a ascensão meteórica de um funcionário público russo do século XIX que, num curto espaço de tempo, se vê transformado em rei da Espanha. Isso acontece, é claro, apenas na cabeça dele.
Nikolai Gógol publicou "Diário de um Louco" em 1835. Por ser um conto narrado em primeira pessoa e estruturado como entradas num diário, o texto de Gógol frequentemente é levado aos palcos sem adaptação, na forma de monólogo. Mas tomar prosa como dramaturgia não é fácil, nem para os atores, nem para o público. Felizmente, a atual montagem de Diário de um Louco é estrelada pelo brilhante Milhem Cortaz. Ator de múltiplos recursos e grande talento, ele dá ao personagem Akcenti Ivánovitch uma humanidade que nos conquista.
Ao entrarmos na sala de espetáculo, o cenário criado por Nello Marrese nos recebe de cortinas abertas. No fundo do palco, uma estrutura de arame nos faz pensar naquelas aranhas pernudas. Pensei também em sinapses cerebrais, bem adequadas a uma peça sobre loucura (mas não só: é ainda sobre amor não correspondido, abismo entre as classes sociais, estrutura estatal opressora, entre outras coisas). Então o espetáculo começa, o palco é iluminado e Milhem Cortaz entra em cena com um guarda-chuva sem tecido, apenas o cabo e as varetas. É quando percebo: a estrutura no fundo do palco é feita de vários "esqueletos" de guarda-chuvas quebrados.
O diretor Bruce Gomlevsky encontra soluções criativas: a certa altura, Akcenti lê cartas supostamente escritas por uma cachorrinha de madame (pet da mulher por quem ele é apaixonado, filha de seu chefe), mas nós, que estamos fora de sua cabeça, o vemos ler bulas de remédio no lugar das tais cartas.
Aos poucos a peça ganha tintas dramáticas. Nosso herói finalmente chega à Espanha (hospício) e passa a sofrer com os estranhos costumes da Corte: "Hoje me rasparam a cabeça, embora eu gritasse com todas as forças que não queria ser monge."
Mais adiante, num delírio, ele vê a própria mãe: "Estreita em teus braços o teu pobre filhinho! o mundo não é para ele! perseguem-no! – Mãezinha! tem pena de teu filhinho doente!"
Logo o espetáculo se encerra, as luzes da plateia se acendem e nossos olhos ainda estão marejados.
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Diário de um Louco foi assistida em 26 de maio de 2024 no Teatro Viradalata.
Crédito da foto: Lu Lacerda, o blog do Rio