O Fazedor de Teatro
- Frank Abreu
- 14 de abr. de 2024
- 2 min de leitura

A prosa irada, hiperbólica, repetitiva e hipnótica do austríaco Thomas Bernhard (1931-1989) é razoavelmente conhecida no Brasil. Já sua vasta dramaturgia, composta por 28 peças, ainda é um território a ser desbravado pelos encenadores brasileiros. Neste contexto, a montagem de O Fazedor de Teatro, levada ao palco pela Companhia Razões Inversas, é um acontecimento a ser comemorado.
O leitor familiarizado com a prosa de Bernhard não estranhará a verborragia de seu teatro. Em ambos os gêneros, os personagens do autor são repetitivos, violentos e exagerados.
Em O Fazedor de Teatro, Bruscon é um ator, dramaturgo, diretor e dono de uma companhia teatral formada por ele próprio, sua esposa e seus filhos. A trupe chega em Utzbach, uma pequena cidade no interior da Áustria. No salão de bailes da hospedaria local, Bruscon pretende representar uma peça de sua autoria (que ele considera a maior do século), intitulada Roda da História: A Comédia da Humanidade.
Na montagem da Companhia Razões Inversas, Bruscon é brilhantemente interpretado por Paulo Marcello, sob a direção de Marcio Aurelio. Ao longo de quase duas horas (durante as quais os outros personagens mal abrem a boca), vemos e ouvimos Bruscon despejando uma avalanche de frases grotescas, distorcidas por sua megalomania e sem qualquer linearidade. A fala de Bruscon dá voltas obsessivas em torno dos mesmos temas, em especial o ódio por seus conterrâneos: os austríacos, em sua opinião, são asquerosos, estúpidos, nazistas; a Áustria é o abscesso purulento da Europa e lá todos os homens são Hitler.
Bernhard nos faz rir sempre que Bruscon descreve uma cena de sua Roda da História (a maior peça do século). Numa das cenas, Hitler bebe com Napoleão e Roosevelt, noutra, Kierkegaard socorre Goethe que se engasgou. Também aparecem Churchill, Einstein, Madame Curie, entre outros.
Samir Signeu, tradutor de O Fazedor de Teatro, informa que o título faz uso de uma expressão idiomática em alemão, theater machen, “associada ao fazer escândalo ou cena; muitas vezes sobre coisas sem importância e apresentando uma reação excessivamente violenta aos fatos.” Qualquer semelhança com o comportamento de Bruscon não é mera coincidência.
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O Fazedor de Teatro foi assistida em 7 de abril de 2024 no Teatro Municipal Arthur Azevedo.